Facebook Twitter Linked In Mais opções
imagem de destaque

OUT.FEST 2024 – Kakuhan, Caveira, Speaker Music, H31R, Lenhart Tapes, Nídia & Valentina, Oko Dj e outros

O OUT.FEST – Festival Internacional de Música Exploratória do Barreiro, é um festival anual com uma programação que divulga o que de mais significativo se faz na música experimental contemporânea, da música improvisada à eletrónica abstracta, do free-jazz ao noise, do hip-hop de vanguarda à música clássica contemporânea, entre outras novas e inclassificáveis linguagens.

A par com a música, mostra-se um excitante universo de experiências e cruzamentos inter-media que fervilha de novidade, desafiando as regras e as fronteiras clássicas das formas de expressão artística e humana.

Desde 2004 o OUT.FEST apresentou já mais de 300 concertos em mais de 50 espaços diferentes do Barreiro, acolhendo músicos de todos os continentes e promovendo novas colaborações e trabalhos comissariados, dando a conhecer outros universos sonoros a mais de 2000 espectadores anuais.

A dição deste ano, que decorre entre 2 e 6 de outubro, assinala 20 anos do OUT.FEST, um festival que se tornou uma das marcas culturais da área metropolitana de Lisboa, de divulgação de novos sons e novas formas de ouvir em espaços e recantos inesperados da cidade do Barreiro..

Ao longo de cinco dias, mais de 30 concertos de músicas surpreendentes vindas de Portugal, França, Reino Unido, Brasil, Estados Unidos, Sérvia, Japão, Bélgica, Holanda, e Argentina, entre outros países.

No dia 5, a programação apresenta Eve Aboulkheir (16h15), Tomé Silva (17h05) e Jules Reidy (17h55), todos na Biblioteca Municipal, Alfredo Costa Monteiro (17h00), Ulla & Perila (18h00) e Kakuhan (19h00), todos na Sociedade de Instrução e Recreio Barreirense (SIRB) “Os Penicheiros”, e Nu No (21h30), Caveira (22h15), Speaker Music (23h05), H31R (32h50), Lenhart Tapes(00h30), Nídia & Valentina (01h20) e Oko Dj (02h05), todos na ADAO – Associação de Desenvolvimento Artes e Ofícios.

Eve Aboulkheir

Compositora e artista sonora sediada em Paris, Eve Aboulkheir tem vindo a pôr em prática os seus ensinamentos académicos através de instalações, performances e composições onde a manipulação electro-acústica de gravações de campo e a síntese modular se intersecionam com vista à criação de um “novo mundo” acústico absolutamente imersivo e sensorial.

Após ter editado ’22/12/2017 Guilin Synthetic Daydream’ na celebrada série GRM Portraits (e merecido com esse disco uma magna recomendação do Sr. Jim O’Rourke), lançou no final do ano passado pela KRAAK ‘Hypnagogic Walks’.

De título perfeito e praticamente auto-explicativo, ‘Hypnagogic Walks’ assume esse estado liminal entre a vigília e o sono, onde alucinações vividas se confundem com a realidade, em oito peças plenas de detalhes que tanto resplandecem como se ocultam.

Tomé Silva

Jovem músico com atividade imparável em diversas frentes ao longo dos últimos anos, o almadense Tomé Silva revela uma dedicação e minúcia quase que inaudita para a idade e percurso.

Dos bangers jungle de ‘All I Am Is We’, às explorações tímbrico-emocionais de ‘Quando Voltar ao Chão’, passando pela produção de ‘Suspiro…’ de Maria Reis, e consequente bateria na banda que a acompanha ao vivo, Tomé Silva revela já uma maturidade na composição, no som e nos arranjos que, mais do que nos fazerem ansiar por passos futuros, devemos testemunhar agora.

Jules Reidy

Tomando como ponto de partida o som rico da sua hexaphonic guitar, Jules Reidy erige do seu som acústico e processado uma música cuja expressão consegue ser simultaneamente tão familiar quanto insondável, (de)sencarnando o espírito da Takoma de Mestre John Fahey em temas onde a eletrónica mais cintilante da eMego, a hipnose de Tashi Wada ou a languidez de Hope Sandoval aparecem como espectros vagos.

Referências mais ou menos possíveis, mas ainda assim incapazes de mapear esta música intangível, onde acordes límpidos de guitarra se sustém numa neblina de reverberações e drones, num jogo de espelhos evocativo a que acorre uma voz resgatada à paisagem numa melancolia de auto-tune.

‘Trances’, lançado no ano passado pela Shelter Press, após discos na Black Truffle ou Editions Mego, leva o seu título a peito, numa demanda de 44 minutos seccionada em momentos de pura absorção sensorial, tão familiar quanto insondável.

Alfredo Costa Monteiro

Figura bem discreta mas com papel indelével no panorama das músicas experimentais em solo europeu, Alfredo Costa Monteiro tem sido um incansável explorador sónico desde meados da década de 90. Nascido no Porto, mas sediado já há largos anos em Barcelona, Costa Monteiro tem habitado por entre a improvisação, a instalação, a arte sonora e a poesia num processo de busca constante, quer a solo quer numa rede fértil de colaborações com artistas nacionais ou internacionais do mais alto calibre.

Do seu trabalho com instrumentos como a guitarra ou o acordeão a todo um manancial de objetos em estado puro ou modificados e criados pelo próprio, para além da sua voz, persiste na sua obra vasta uma contínua investigação em torno das potencialidades do som, dos seus limites musicais e das suas inúmeras possibilidades tímbricas, harmónicas e texturais num ofício paciente e sempre inquisitivo.

Ulla & Perila

Lançado ali naquele momento precioso em que Ulla Straus e Alexandra Zakharenko tcp Perila se tornaram parte da consciência colectiva, ‘LOG ET3RNAL’ chegou-nos em 2020 como aquele match made in heaven entre duas figuras do ambient fora dos trâmites mais tacanhos e sonâmbulos.

Emparelhando a sensibilidade distinta, mas complementar, dessas duas mentes sob o nome de LOG, aquele que é ainda o seu único registo de longa duração – com direito a uma coda devidamente intitulada ‘Memories of Log’ – acolheu com sobriedade as faculdades comuns – um lado quase diarístico no uso de gravações de campo, pads carcomidos, texturas evocativas da névoa da memória – e díspares – os sons à beira da dissolução de Perila ou as invocações ASMR de Ulla – de ambas num fluxo pleno de detalhe e profundamente imersivo.

Tão marcante quanto os definitivos ‘Tumbling Towards a Wall’ de Ulla ou ‘How Much Time Is It Between You And Me’ de Perila. Soporífero em tudo de bom que isso possa significar.

Kakuhan

Mais uma investida nascida da mente brilhante de Koshiro Hino – também conhecido como YPY e membro dos goat (jp) entre outras excursões, sempre prementes -, aqui em conluio com o violoncelista Yuki Nakagawa – colaborador de gente como Eli Keszler ou Joe Talia -, KAKUHAN fazem jus ao nome escolhido – algo como a “mistura de diferentes elementos” em japonês – numa simbiose electro-acústica que se expande muito, muito para além do que o termo costuma acarretar.

Mais do que uma proposição binária de eletrónica com um instrumento clássico, a música de KAKUHAN soa como que a uma entidade viva onde ritmos em constante convulsão interna – tracemos uma linha de Photek a Autechre ou errorsmith para referência – se envolvem e desenvolvem por entre linhas de violoncelo tão dramáticas como transportadoras – tão Arvo Pärt quanto Arthur Russell.

E por muito que gostássemos que o título do seu primeiro álbum – Metal Zone – fosse uma homenagem ao clássico pedal de distorção da Boss, haveria com certeza uma explicação bem mais prosaica para este som fixado no presente mas a indiciar futuros.

Nu No

Performer, ator, radiotransmissor e músico, Nuno Marques Pinto tem sido uma salutar presença regular em diversos palcos e não-palcos deste país.

Tomando a voz e o corpo como elementos indissociáveis, Nu No cria uma disrupção com as lógicas canónicas e formais da linguagem, numa demanda pré-verbal onde a respiração, o ritmo e o movimento tecem acontecimentos que ocultam e revelam a possível narrativa na fonética e na própria entrega.

Uma torrente de repetições, gritos, ganchos melódicos de cunho bem punk, performática no seu estado mais essencial. Fora de ação in loco, tem também editado de forma algo esparsa mas sempre contundente por editoras como a 8mm ou, mais recentemente, a Russian Library.

Caveira

A chegar a duas décadas de existência, o combo-tumulto capitaneado pelo guitarrista e agitador Pedro Gomes regressa ao OUT.FEST na senda da edição daquele que é, até nova ordem, o documento definitivo de CAVEIRA com a formação estável dos últimos anos, que conta também com Miguel Abras no baixo, Gabriel Ferrandini na bateria e Pedro Alves Sousa no saxofone.

Lançado este ano pela Shhpuma, ‘Ficar Vivo’ traz no seu título – e na música, claro – o manifesto de intenções de uma banda que, por entre várias existências e realidades deste país, tem teimado não só em manter-se viva como em fazer desse ato um processo constante de invocação dos espíritos mais febris e exultantes do rock, dos blues, do free jazz e do noise para os expelir numa dinâmica constante entre o êxtase da libertação e a tensão do devir.

Speaker Music

Passado pouco tempo desde a elevação do Techno de Berlim a Património da Unesco é urgente relembrar a campanha-slogan “Make Techno Black Again” propalada por DeForrest Brown Jr. Intrépido jornalista, teórico, curador e músico, Brown Jr. assume para este último ofício o nome de Speaker Music, num corpo de obra transversal a todas essas facetas que visa questionar de forma bem assertiva e corajosa noções de raça, classe, pós-colonialismo e estruturas sociais estanques à sombra da história.

Partindo de ensinamentos em torno do Afrofuturismo, em particular nas obras de Kodwo Eshun e Henri Lefebvre, Speaker Music assenta espiritual e conceptualmente numa linhagem que vai do Techno original, às visões de Drexciya ou à ‘Black Secret Technology’ de A Guy Called Gerald, com todo o legado precedente que isso acarreta.

Em termos práticos, uma densa tecelagem rítmica em constante mutação, como se os mecanismos sintéticos do Techno se libertassem numa polirritmia informada pelo free jazz e cunhada em discos de título tão incisivo como ‘Black Nationalist Sonic Weaponry’ e ‘Techxodus’. 

H31R

Nascidas entre Nova Jersey e Nova Iorque, através da produtora JWords e da rapper maassai, as H31R conseguiram, logo ao primeiro disco, revelar uma visão que, sem desfiar completamente o novelo que as liga à história do hip-hop, faz por encontrar uma rota ainda por sondar para onde acorrem diferentes eras e fontes – jersey club, electronica, boom bap.

‘ve·loc·i·ty’, em 2020, foi o tal manifesto de intenções que ‘HeadSpace’, lançado no final do ano passado pela Big Dada, veio a confirmar e expandir, com uma música tão exploratória na forma como empática na entrega.

Por entre batidas fractais e teclados psicotrópicos de uma fluidez hipnótica e nunca impositiva de JWords, maassai vai tecendo rimas intrincadas que respiram em ganchos memoráveis e rasgos de luz r&b que tanto pairam naquela aura sonhadora de KING como na languidez de THEESatisfaction – não por acaso, também elas alinhadas com um espírito bem DIY e cunho psicadélico – sem com isso se colarem a referências particularmente identificáveis. É um mundo delas, ao qual acorremos.

Lenhart Tapes

Verdadeiro alquimista da fita, Vladimir Lenhart tem dado vida a Lenhart Tapes recorrendo a quatro walkmans e uma infindável colecção de cassetes que abrangem gravações de campo, spoken word, folclore balcânico e mediterrânico, instruções e todo o tipo de rituais que é continuamente recontextualizada e processada numa música onde loops repetitivos se debatem com irrupções de ruído, memórias oníricas e colagens brutas.

Mais recentemente, este artista sediado em Belgrado tem vindo a cruzar essas suas criações com o legado da folk do seu país e da região envolvente através da colaboração com diversas vocalistas, como postulado em ‘Duets’ de 2021.

Dessas vozes, destaca-se a de Tijana Stanković, que chega aqui ao OUT.FEST a acompanhar as deambulações muito tácteis de Lenhart com uma voz que carrega em si todo o peso da tradição para uma realidade paralela.

Nídia & Valentina

Encontro surpreendente mas pleno de sentido entre duas artistas de trabalho distinto mas igualmente vital em torno das potencialidades infinitas do ritmo e da percussão.

Já com três álbuns em carteira, Nídia é dama da Príncipe: dj e produtora cuja visão bem vincada em torno da batida tem sido continuamente lapidada para fora de qualquer taxonomia mais sedimentada, encontrando sempre novas avenidas e curvas de expressão, com tanto de emocional como de físico.

Baterista, percussionista e compositora italo-britânica, Valentina Magaletti é hoje uma das figuras mais imponentes nas músicas exploratórias em curso, num trilho hiperactivo que tanto a encontra em explorações a solo, como parte de bandas como Holy Tongue, Moin ou CZN e diversas colaborações.

Neste acerto simbiótico, a ter lançamento debutante em Setembro pela Latency, síncopes hipnóticas, linhas de marimba incandescentes, guinadas rítmicas e uma cuidadosa inventividade nos arranjos harmónicos são postuladas em temas para o corpo e para a memória.

Oko Dj

Co-fundadora da LYL Radio, onde mantém o seu ‘Pu$$y Nightmare’ faz mais de meia década, Marine Tjordemann tcp OKO DJ tem sido uma das mais activas e irreverentes agitadoras do éter e das pistas em solo europeu.

Parte central da Brothers From Different Mothers e metade do duo Women In The Royal Courtship, ao lado de Tryphéme, lançou em 2020 ‘Dans Le Lune’ como peça complementar da fanzine do mesmo nome editada pela FUTUR 2010, onde espelha as quatro fases do ciclo feminino e as suas implicações místicas e libertadoras numa música em passada lenta, onde texturas do industrial mais esotérico vão de encontro a sintetizadores esquinados, ecos dos confins e melodias prenhes em mistério.

Nos seus sets, assume essa liberdade e sentido de descoberta de uma forma praticamente ritualista, descobrindo pontos de contacto entre músicas aparentemente inconciliáveis de uma forma tão fluida quanto surpreendente.

Informações e programa completo em www.outfest.pt

Organização: OUT.RA – Associação Cultural. Apoio: Câmara Municipal do Barreiro.

Actualizado a 25/09/2024
To top